Relatório de sindicância revela ‘escala paralela’ seguida pelos médicos do Samu no RS; veja detalhes


Relatório obtido com exclusividade pela RBS TV detalha apuração, que originou abertura do processo disciplinar sobre caso revelado no ano passado. Médicos deixando o local de trabalho antes do horário previsto foram flagradas pelas equipes de reportagem. Relatório de sindicância confirma denúncias de irregularidades no atendimento do SAMU
Depoimentos obtidos durante uma sindicância, que apurou as suspeitas de fraude na carga horária dos médicos da Central de Regulação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), confirmam que os profissionais cumpriam até um terço da jornada de trabalho, que seria uma “escala paralela” à prevista por contrato.
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A RBS TV e o Grupo de Investigações do Grupo RBS tiveram acesso, com exclusividade, ao relatório da sindicância. Em 93 páginas, a investigação é detalhada a partir dos depoimentos. Ex-diretores e coordenadores foram responsabilizados, e um processo disciplinar contra os médicos foi aberto. Confira mais abaixo as defesas dos médicos citados na sindicância.
Em depoimento, o plantonista Kleiton Blancos confirmou a existência de uma escala paralela para trabalhar menos. Disse que os plantonistas faziam uma divisão: parte dos médicos ficava das 19h à meia-noite, e que outra parte ficava da meia-noite às 4h, ou da meia-noite às 3h30.
Alguns faziam o plantão apenas das 3h30 ou 4h até as 7h. Médicos deixando o local de trabalho antes do horário previsto foram flagradas pelas equipes de reportagem. A falta de médicos gerava demora de até 2h para atendimentos do Samu.
Uma das médicas envolvidas no esquema, Tarine Christi Trennpohl, afirmou que desde 2020, quando começou a pandemia, a ordem era cumprir parte do plantão na forma presencial e parte em regime de sobreaviso em domicílio, à disposição da chefia. Essa orientação seria por ordem do então coordenador médico, Jimmy Herrera, que foi afastado do cargo durante as investigações.
A médica Clarisse Stefani deu a mesma explicação para trabalhar menos do que deveria e disse que, até a data do depoimento, não recebeu nova orientação da chefia.
Ao examinar depoimentos e provas, a comissão de sindicância não aceitou essa justificativa e confirmou que os médicos cumpriam apenas um terço da jornada.
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20 minutos sem médicos
A sindicância confirmou ainda que a sala do Samu chegou a ficar por 20 minutos sem médicos para atender a pedidos de socorro de mais de 300 cidades gaúchas.
O documento revela que a médica responsável pelo horário, Giordana Trindade, confessou que se afastou da mesa e precisou ir até o banheiro pois estava grávida e não passava bem.
A denúncia contra a médica era de conhecimento do então diretor de Regulação do estado, Eduardo Elsade, que foi afastado durante as investigações.
Cedido do município de Porto Alegre para trabalhar no órgão estadual. O relatório no qual a sindicância afirma ter indícios de irregularidades contra ele foi enviado à prefeitura. A Secretaria Municipal de Saúde afirma que examina o caso.
Médicos do SAMU fazem escala própria e trabalham menos do que o acordado
Reprodução/RBS TV
Garrafinha no teclado
A sindicância também identificou, por imagens de câmeras de segurança, que a servidora Mara Regina Aquino Costa é a médica que teria colocado uma garrafinha de água no teclado para burlar o sistema, simulando que uma pessoa estava logada.
Uma falha no controle no ponto também ficou comprovada. A sindicância cita Carla Berger, que deveria fazer esse controle, além do próprio Eduardo Elsade, também citado, assim como a então diretora adjunta, Laura Sarti Oliveira e Jimmy Herrera, coordenador médico afastado. O relatório diz que todos sabiam das irregularidades e nada fizeram para solucioná-las.
Os médicos que descumpriam a carga horária não são citados entre os responsabilizados. O relatório sugere que cada um deles responda a um processo administrativo disciplinar.
Imagem simula estratégia de médica do SAMU para fingir que estava trabalhando: deixar uma garrafa d’água pressionando teclas do computador enquanto estava fora
Reprodução/RBS TV
O que dizem os envolvidos
A Secretaria de Saúde de Porto Alegre não quis se manifestar, nem informar quantos processos administrativos já foram abertos contra os médicos.
Eduardo Elsade, que era diretor de regulação do estado na época, disse que não teve acesso completo aos autos, mas que a conclusão sem provas materiais está sendo questionada nas esferas administrativa e judicial.
A defesa de Carla Berger, coordenadora substituta do Samu, que era responsável pelo controle do ponto, disse que não teve acesso ao relatório da sindicância nem aos autos. No entanto, destacou que nenhuma infração funcional foi praticada pela servidora, o que será devidamente demonstrado no processo.
Laura Sarti Oliveira, então diretora-adjunta, não respondeu ao pedido de entrevista. A RBS TV não conseguiu contato com os médicos Kleiton Blancos, Mara Regina Aquino Costa, Tarine Trennpohle, e Giordana Vargas Trindade. A médica Clarisse Stefani atendeu a ligação, mas não quis se manifestar.
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