Centenário de Zabé da Loca: símbolo de resistência, rainha do pífano tem legado mantido em complexo turístico na PB


Radicada em Monteiro, no Cariri da Paraíba, Zabé da Loca completaria 100 anos nesta sexta-feira (12). Zabé da Loca, a rainha do pífano
Reprodução/TV Paraíba
Há um século, no dia 12 de janeiro de 1924, nascia em Buíque, Pernambuco, Isabel Marques da Silva. Em Monteiro, no Cariri da Paraíba, ela se tornou Zabé da Loca, importante nome da cultura popular do Nordeste. Nesta sexta-feira (12), dia que marca o centenário da artista, o g1 relembra a trajetória e o legado da rainha do pífano.
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Zabé da Loca é uma das personagens símbolo da resistência da cultura popular nordestina. Ainda adolescente, ela saiu de Pernambuco para o Cariri paraibano, e por cerca de 25 anos morou em uma gruta.
O nome “Zabé da Loca” se popularizou, justamente, por conta do lugar onde Zabé vivia. Mas, depois de mais de duas décadas morando na gruta, ela ganhou, em um processo de reforma agrária, uma casa no assentamento Santa Catarina, no município de Monteiro.
Gruta onde Zabé da Loca morou por mais de duas décadas, em Monteiro, na Paraíba
Arquivo Pessoal/Edvaldo José
Em entrevista concedida ao Globo Rural em 2011, Zabé, na época com 86 anos, falou sobre o trabalho árduo como agricultora, com o qual sustentou a família por muitos anos.
“Eu já trabalhei muito. Trabalhei tanto que fiquei velha no tempo. Pai gritava. Nós éramos quatro. Era um em casa mais a mãe e os outros no roçado mais ele. Me criei trabalhando, minha filha”, disse Zabé em entrevista ao Globo Rural, em 2011.
Além da agricultura, a vida de Zabé também era embalada pelo som do pífano, instrumento musical tipicamente nordestino, cujo som ecoado no sopro soa como o de outros tipos de flauta.
E foi com o pífano e com as histórias do tempo em que viveu na gruta que Zabé ficou conhecida em várias partes do mundo.
Reconhecimento
Foi somente quando já tinha quase 80 anos que a história de Zabé da Loca ficou nacionalmente conhecida. Ela foi descoberta aos 79 anos, quando ainda morava na gruta, pela equipe do projeto Dom Helder Câmara, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), na época Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Na época ela gravou o seu primeiro CD, “Canto do Semi-Árido”, com composições próprias e versões de Luiz Gonzaga e Humberto Texeira.
O som do pífano de Zabé encantou Brasil afora, e no auge de seus 85 anos, em 2009, ela ganhou seu primeiro grande reconhecimento, recebendo o prêmio Revelação da Música Popular Brasileira. Vários outros prêmios, como a Medalha de Ordem ao Mérito Cultural, concedida à Zabé pelo Governo Federal, também foram entregues a artista ainda em vida.
Em 2017, aos 92 anos, Zabé da Loca morreu, em Monteiro. A família informou que Zabé morreu de causas naturais, e que nos últimos anos de vida ela soria com o alzheimer.
Tocadora de pífano Zabé da Loca lutava contra alzheimer
Legado de Zabé da Loca
O legado de Zabé da Loca começou a ser preservado quando a artista ainda estava viva, com a criação da Associação Cultural Zabé da Loca, instalada na própria casa da artista. O local foi criado por Josivane Caiano, afilhada da artista e responsável pela preservação de seu patrimônio.
Atualmente, anos depois da morte de Zabé, a iniciativa para preservação de sua obra e patrimônio cresceu e se transformou no Complexo Turístico Zabé da Loca. O local possui restaurante, memorial com a história da pifeira e trilhas guiadas para a loca onde ela morou.
Casa onde morou Zabé da Loca e onde atualmente funciona o Memorial Zabé da Loca
Arquivo Pessoal/Edvaldo José
O complexo é mantido por Josivane com a ajuda de familiares. De acordo com ela, não há apoio financeiro fixo destinado aos trabalhos de preservação da obra de Zabé e à manutenção de seu patrimônio. Os projetos que funcionavam com oficinas musicais, incluindo aulas de pífano, também não estão acontecendo por falta de incentivo financeiro, ainda segundo a responsável pelo lugar.
Para Josivane, manter o funcionamento do complexo, mesmo com tantos desafios a serem superados, é uma forma de mostrar ao mundo quem foi Zabé da Loca, e de retribuir também todo cuidado que um dia, em vida, Zabé ofereceu a Josivane e aos demais familiares e membros da comunidade onde viveu.
“Manter o memorial é mostrar para o mundo o legado da minha madrinha. Uma pessoa forte, resistente que foi a frente do seu tempo… 90% da mulher que sou hoje devo a minha madrinha. Aprendi a ler e escrever pela minha madrinha, e hoje sou a mãe, a avó, a representante da comunidade graças a Zabé”, relatou Josivane.
Vida e obra de Zabé da Loca é preservada em memorial, em Monteiro, Paraíba
Arquivo Pessoal/Edvaldo José
Josivane reitera que Zabé da Loca plantou em vida o sentimento de pertencimento nas pessoas da comunidade que viveram, junto com ela, no assentamento Santa Catarina, em Monteiro. O lugar segue abrigando não apenas a gruta com a artista viveu por anos, como também a energia de resistência deixada pela pifeira.
“Ela deixou um legado muito grande, um sentimento de pertença da nossa comunidade, das pessoas que estão a volta, do agradecimento pela vida, pela existência. Por isso me esforçar para manter o Complexo é mostrar ao mundo a importância de ter Zabé da Loca”, disse Josivane.
O Complexo Turístico Zabé da Loca recebe turistas diariamente e apresenta a eles a história da pifeira. A organização do local cobra na entrada uma taxa com valor simbólico, para auxílio na manutenção do espaço. O agendamento de visitas é feito pela internet, nas redes sociais da associação.
“Os turistas saem daqui encantados com a história da Zabé, com a energia do lugar. E hoje a gente está recebendo bastante turista para conhecer a história de Zabé, que viram ela na internet e chegam ao lugar pra ter contato com a história dela, com os instrumentos. É uma energia muito boa e eles saem maravilhados”, conluiu Josivane.
Josivane com turistas no Memorial Zabé da Loca, em Monteiro, Paraíba
Arquivo Pessoal/Edvaldo José
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