Elogiado por João Gilberto, Edésio César leva a guitarra além do rock: ‘Prazer em tocar outras coisas’


Pernambucano de Serra Talhada e radicado em Petrolina, o músico de 34 anos vem se destacando e colecionando parceiros ao longo da carreira. Edésio César, músico.
Andressa Silva g1/Petrolina
“Eu costumo dizer que todos os dias a gente tem que acordar e pedir a bênção, tem que se ajoelhar. Acho que o que mais torna ela fascinante de todas as coisas é que é como se fosse uma coisa líquida, você não a detém. Como Gil fala: ‘a deusa música’; é uma deusa mesmo”. É assim que Edésio César Vieira Santos, de 34 anos, enxerga o significado da música em sua vida.
Autodidata, o serratalhadense radicado em Petrolina, no Sertão de Pernambuco, vive desde os seis anos no município. Sua paixão pela música começou aos nove, pela convivência com uma família de músicos. Tinha como exemplo seu pai, avôs e tios.
Após se familiarizar com a música, Edésio teve como mestre seu pai, Edésio Espedito, multi-instrumentista. Com ele, aprendeu a arte dos acordes por três anos. A partir daí, buscou por conta própria o conhecimento através de videoaulas, estudando métodos, livros, e, como costuma dizer, “aprendendo a tocar de ouvido”.
“Naturalmente com dois, três anos de idade eu já brincava de virar brinquedos, simular bateria com eles. Com 14, eu já tava tocando no palco. Foi difícil porque meu pai não queria, na verdade, ele tinha receio, sendo pai e músico também. Então sofri um pouco porque eu tentava entrar na noite, mas ele só deixou quando completei 15 anos”, relatou Edésio.
Nesse início de carreira, as vivências nos palcos também o formaram. Aos 15 anos, começou a tocar com Alan Cleber, na banda Drops de Anis. “Era uma banda que tinha bastante influência na região, então foi muito importante pra mim, foi de um aprendizado não só musical, mas para a vida”, lembra.
‘Baião pro João’
Sem deixar a música de lado, Edésio estudou jornalismo. Como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), escreveu, em parceria com a colega de classe, e hoje esposa, Edilane Ferreira, o livro ‘Lento Caminhar – Histórias e Canções de Edésio Santos’, apresentado em 2013.
A motivação para o livro foi o fato de Edésio César ser constantemente confundido com Edésio Santos, um dos grandes nomes do cenário musical do Vale do São Francisco.
“Todo mundo me perguntava se eu era neto do Edésio Santos, se eu tinha algum parentesco com ele; e só foi uma coincidência, muito feliz”, diz o guitarrista, que foi batizado com o nome do pai, Edésio Espedito, que por sua vez homenageia o maestro Edézio Alves, de Serra Talhada, do grupo Edézio e seus Red Caps .
Embora não compartilhem nenhum parentesco, a música se encarregou em unir os xarás. “A gente se encantou, foi um uma experiência muito especial porque ele tinha como sonho gravar um disco e não conseguiu. E aí a gente se sentiu com essa grande responsabilidade de materializar um livro contando a história dele”, afirma Edésio.
Nessa jornada para conferir informações sobre o personagem, o estudante de jornalismo conseguiu, após mais de um mês de ligações, o que muito repórter tentou em vão: falar com o pai da Bossa Nova e amigo de Edésio Santos, João Gilberto. Além de tirar dúvidas, pôde apresentar a música ‘Baião pro João’, feita em homenagem ao cantor e compositor que mudou a história da música brasileira .
“Foi engraçado, eu conversei com João Gilberto. Porque algumas pessoas difundiram o boato de que Edésio Santos supostamente havia ensinado João Gilberto a tocar violão. E, depois, a gente descobriu que não foi bem assim; eu pude comprovar nessas ligações. Em uma delas eu pude mostrar para ele a música. E ele gostou muito. Até hoje ainda fico digerindo essa experiência. É um sonho tão forte que parece que foi real, mas foi mesmo real”, disse.
Edésio César, músico.
Andressa Silva g1/Petrolina
Para Edésio, ‘Baião pro João’ é uma das suas músicas mais especiais. Por ser uma de suas primeiras composições e por ter feito para João Gilberto. Disponível no álbum Mandacari, a música foi lançada em 2017 (ouça aqui).
Soma de várias experiências
Edésio toca Homenagem à Mestre Chicão, de Dominguinhos
“Eu acredito que, no mínimo, sou a soma de várias experiências, de artistas que ouvi, que me inspirei. Nunca escondi que sou um roqueiro mesmo, guitarrista do rock, que tem o prazer de tocar outras coisas, que tem orgulho de tocar as coisas da gente; o frevo, o baião de Luiz Gonzaga, o forró de Dominguinhos. E de poder falar das nossas belezas e trazê-las na nossa obra”, declara Edésio.
O artista toca e aprecia instrumentos de corda, como violão, bandolim, guitarra, guitarra baiana, cavaquinho e viola caipira. E é nesse universo, com versatilidade de notas e acordes, que a música instrumental de Edésio conta histórias. Em seu primeiro álbum, Mandacari, é possível ouvir o canto do pássaro, em ‘Encanto da Rolinha’, e sentir a adrenalina transmitida em ‘Vixe Segura o Preá’, por exemplo. (Clique aqui para ouvir).
Edésio conta que, em sua vivência, se tornou um artista que tem como principal objetivo mostrar sua própria verdade. “Tem esses passeios que faço, a minha música é muito plural. Então isso causa um estranhamento, acredito, porque eu vou de um extremo ao outro e isso para mim é normal, eu cresci assim, na minha vivência musical isso sempre foi normal, fez parte da profissão”, pontuou.
Ao longo de sua carreira, permeou por muitos estilos musicais, entre eles, o rock, onde toca com a banda Por Um Três, desde 2017. O grupo é formado por ele na guitarra, seu pai, Edésio Espedito, na voz e baixo, e seu irmão, Eduardo Vieira, na bateria. Em sua essência, a banda mistura o rock com influências do nordeste, como Luiz Gonzaga na música, Guimarães Rosa na literatura, Patativa do Assaré, na poesia.
“Eu sempre tive esse sonho de poder dividir o palco com meu pai. E acabou que rolou essa possibilidade, e a gente lançou o que costumo dizer que é um DVD/álbum; são músicas autorais e a gente fez o trabalho audiovisual também. A gente busca mesclar as vertentes do rock and roll com elementos da música regional”, detalha Edésio. Veja no vídeo abaixo.
Conheça a banda ‘Por um três’ formada por pai e filhos
Amante de guitarra baiana e do frevo, em 2020, ganhou o instrumento, que até então não tinha, e lançou o álbum ‘No Pique de Sereninha’. Com três músicas, a produção homenageia o nascimento de sua filha, e Armandinho, mestre da guitarra baiana e filho de Osmar Macêdo, um dos criadores do trio elétrico.
Em meio a várias influências musicais, no mesmo ano, Edésio se aproximou de Juracy Marques, através de um retiro espiritual que participou. Desse encontro, eles compuseram e lançaram músicas de rezo, como o álbum ‘O espírito da Serra: a natureza da Jurema’ (ouça aqui).
Edésio também compõe com a esposa, Edilane Ferreira, com quem concorreu ao Festival de Música Geraldo Azevedo, com ‘Oxumaré é Amor’, em 2024. Tanta diversidade e dedicação, fez com que ele fosse premiado em alguns concursos nacionais de guitarra; no primeiro deles, conquistando o 2° lugar.
“Foi bem especial porque até então eu não havia ganhado nada assim, de mais expressão. Aí fui para São Paulo, toquei lá, foi um divisor de águas. Eu pude ver como a música tem esse poder de transformar uma vida. Você viajar, mostrar sua música para outras pessoas e ver que tem outras pessoas que conhecem você em outros lugares, é bem mágica essa experiência”.
Também ganhou os prêmios ‘Riffs Inspiradores’, realizado por uma marca de cabos; e, foi escolhido entre mais de mil inscritos pelo guitarrista Kiko Loureiro como vencedor de um concurso realizado por uma marca internacional de guitarras.
O som que une
Edésio César, músico, produtor musical, mentor e sideman.
Andressa Silva g1/Petrolina
Edésio é músico, compositor, mentor e sideman (músico freelance). Após muitos anos nos palcos, atualmente, dedica-se mais às produções musicais em seu estúdio Jhubart 360°, função que iniciou em 2017. Convivendo com diferentes artistas no Vale do São Francisco e em outras regiões do país, conta que a própria jornada musical foi moldando-o a estudar e a aprender novos estilos musicais. E que isso também foi uma questão de sobrevivência, enquanto músico.
“Naturalmente você tinha que tocar, gravar, aprender, porque no dia a dia, o músico lida com vários tipos de música, de gêneros, e para sobreviver, basicamente tem que passear por todos eles. E isso torna o próprio músico muito rico. E quando ele começa a compor, como é o meu caso, uma área que tenho muito fascínio também, essas coisas vão acontecendo, é intuitivo”, relata.
Edésio já trabalhou em vários estúdios, em Petrolina e em Juazeiro, em que gravou ritmos como forró, rock, pagode. Para ele, seu ápice como produtor musical, foi produzir ‘Palco’, de Gilberto Gil, com participação de João Gomes.
“Foi assim um presente, mesmo. Eu não fiz pessoalmente, a gente gravou em momentos distintos, mas a gente fez em conjunto, a produção; pude fazer os arranjos também. Eu tinha gravado dois violões, o Gil chegou, ouviu uma música e perguntou se poderia gravar o violão base, que é aquele que faz a harmonia. Então foi muito mágico, ouvir, assim num clássico dele. E veio essa responsabilidade de a gente criar um arranjo que pudesse unir os mundos de João Gomes e do Gil, foi uma experiência incrível”.
Além desse feat, recentemente Edésio também produziu o single ‘Beija-flor’, para um projeto de DVD da banda Timbalada com João Gomes.
Em mais de 19 anos de carreira e muitas experiências na música, Edésio César confessa que estar nos palcos é o que mais lhe encanta, uma função que exige entrega, verdade e dedicação. E foi essa paixão que o possibilitou grandes encontros em shows, com nomes como Targino Gondim, Cacau Santos, Armandinho Macêdo, Mou Brasil, Camila Yasmine, Fabiana Santiago.
“Para mim sempre dá um frio na barriga. É um momento em que você é desafiado a mostrar que há uma justificativa para estar ali, tocando, é uma coisa sagrada, eu sinto assim. Você respeitar as pessoas, o público que tá ainda ali assistindo [e vai] ouvir de uma forma que o que você faça, seja convincente, seja verdadeiro. Então, apesar de amar o estúdio, o palco eu ainda amo mais um pouquinho, porque realmente é sempre único. É o lugar onde eu me sinto mais pleno de todos”.
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