Mãe que se mudou para o Paraguai em busca do filho desaparecido criou associação e ajudou a encontrar mais de 80 pessoas que também sumiram no país


Paranaense Antonio Augusto Streski Manjinski estudava medicina no Paraguai e sumiu em 2022. Mãe dele, Isabel Streski, alega que não teve apoio das autoridades e, por isso, faz investigações sozinha. Paranaense ajuda mães de outras pessoas desaparecidas enquanto busca pelo próprio filho
A paranaense Isabel Streski conta que já ajudou a encontrar 83 pessoas desaparecidas enquanto procura pelo próprio filho, Antonio Augusto Streski Manjinski, sumido desde outubro de 2022, no Paraguai.
O jovem estudava medicina no país e, desde que desapareceu, Isabel se mudou para lá para fazer a própria investigação. Paralelamente, ela criou e preside a Associação de Famílias de Desaparecidos no Paraguai, que auxilia outras mães e parentes que passam pelo mesmo trauma – com dicas que Isabel gostaria de ter tido quando iniciou a busca pelo filho.
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“As famílias me ligam e falam: ‘Senhora, aconteceu isso, isso e isso’, e eu digo: ‘Vai para tal departamento e faça tal coisa. Vou dando as dicas, sabe, da onde ir, a quem recorrer e qual o procedimento tomar – porque é o apoio que eu gostaria de ter tido quando aconteceu comigo. Eu não tinha pra quem pedir ajuda, não tinha a quem recorrer, a quem me desse uma ideia do que fazer”, desabafa.
Antonio Augusto é natural de Ponta Grossa, cidade dos Campos Gerais do Paraná, e tinha 25 anos quando sumiu na cidade de Mariano Roque Alonso, na região metropolitana da capital Assunção, onde morava. Ele estava no último ano de graduação na Universidad María Auxiliadora (Umax) e residia no país desde 2016. Relembre detalhes mais abaixo.
Antonio Augusto Streski Manjinski é paranaense e está desaparecido no Paraguai.
Arquivo Pessoal
A falta de respostas da polícia sobre o paradeiro do jovem, cujo sumiço não deixou pistas, fez Isabel mudar totalmente a própria vida e decidir, também, compartilhar as próprias experiências ao perceber que não era um caso isolado.
De acordo com relatório da Coordenadoria dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraguai (CDIA), baseado em registros da Divisão de Busca e Localização de Pessoas Desaparecidas da Polícia Nacional, em 2022 – ano do desaparecimento de Antonio Augusto – mais de 1,2 mil pessoas desapareceram no Paraguai, que tem pouco mais da metade da população paranaense.
O número considera apenas pessoas com menos de 18 anos. Segundo o diretor do CDIA, Aníbal Cabrera, do total, apenas 60% voltaram para casa.
Atualmente, a Associação de Famílias de Desaparecidos no Paraguai conta com parentes de mais de 80 pessoas que sumiram no país. Além de compartilhar informações entre si e nas redes sociais, eles também compartilham do mesmo trauma.
“A dor é muito grande, porque quando o filho morre e você o enterra ali, você sabe que ele está ali. Você vai ali, você reza, você faz suas orações – mas você sabe que não tem mais o que fazer. Já quando você não tem notícia, você vive naquela incógnita… Eu sento para comer e penso: será que o meu filho não está passando fome? […] É desesperador. É só quem passa pra saber a dor de uma mãe que sabe o desespero que é”, diz Isabel.
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Desaparecimento motivou mudança e investigação paralela
Paranaense se muda para o Paraguai para procurar filho que desapareceu no país
Isabel Streski estava morando nos Estados Unidos quando o filho sumiu. Ele estava terminando a graduação e ela se mudou para o país norte-americano para esperar o jovem, que sonhava em fazer residência de especialização médica lá.
Quando Antonio Augusto desapareceu, a mãe não pensou duas vezes: viajou para o Paraguai e iniciou uma investigação paralela para tentar achar o filho – que dura até hoje.
Isabel conta que o jovem escrevia um diário e ela entrou em contato com todas as pessoas que eram citadas nele para tentar refazer os últimos passos do filho. Ela também ficou com o celular e com o computador do estudante. Além disso, fez campanhas nas redes sociais e nas imprensas paraguaia e brasileira para tentar conseguir ajuda.
“Eu toquei todas as portas, eu investiguei mais do que, creio eu, qualquer investigador ‘normal’ investigaria. Eu fui em lugares [perigosos] que nem a própria polícia entra! Eu fui em todos os cantos, não deixei de lado nem uma pista – por pequena que fosse”, disse ela, ao g1.
À época, Isabel reportou o caso ao Ministério das Relações Exteriores, o Itamaraty. Ela acredita que o filho foi alvo de um crime, mas as investigações — tanto dela, quanto da polícia — nunca chegaram a nenhum suspeito ou indício concreto do que pode ter acontecido com o jovem.
“Isso é o que mais me desconsola, porque eu consigo encontrar tanta gente, e peguei uma experiência tão grande […] E não encontrar uma pista que seja em relação ao Antonio Augusto, isso me desespera. […] São algumas hipóteses que eu levanto, que não podemos muito tocar no assunto sem ter provas”, afirma.
Para a mulher, desistir não é uma opção – e o sentimento de mãe diz que o jovem está vivo.
“Mas eu não vou desistir, vou encontrar meu filho da forma que for. Ele foi esperado, ele foi sonhado, ele foi desejado. […] Então eu não vou abandoná-lo; seja da forma que for, eu vou encontrá-lo”, afirma Isabel.
Isabel fez campanhas para tentar conseguir ajuda na busca pelo filho
Arquivo Pessoal
O que dizem as autoridades
Segundo o Itamaraty, em casos de desaparecimento de cidadãos brasileiros no exterior, cabe aos consulados “apoiar familiares e representantes jurídicos na busca por informações que ajudem na elucidação dos fatos e na localização do desaparecido, respeitando-se as normas locais”.
“As repartições consulares não contam com poder investigativo ou de polícia. Familiares podem entrar em contato diretamente com o plantão consular da repartição consular responsável pela região do desaparecimento, ou com o plantão consular em Brasília, pelo telefone +55 (61) 98260-0610”, orienta o órgão governamental.
Veja onde obter atendimento consular no exterior
No caso de Antonio Augusto Streski Manjinski, quatro dias após o desaparecimento o Ministério Público do Paraguai divulgou um cartaz com um alerta de buscas, pedindo apoio de denúncias sobre o paradeiro do jovem.
No comunicado, o órgão também disse que comunicou a Polícia Nacional do país, pedindo por investigações. Veja abaixo:
Ministério Público do Paraguai divulgou cartaz com um alerta de buscas pelo jovem
Reprodução/Redes Sociais
Isabel Streski afirma que desde que o filho dela desapareceu, ela entrou em contato com o Itamaraty, pedindo apoio do governo brasileiro nas investigações.
“Na época eles me respondiam, mas depois pararam. Isso dificultou bastante, pois não tivemos nenhuma ajuda do governo brasileiro”, frisa.
Ela também diz que oficializou ao Itamaraty um pedido de envolvimento da Polícia Federal (PF) e da Polícia Civil do Paraná — esta, por meio do Grupo Tigre (Tático Integrado de Grupos de Repressão Especial), que é especializado em situações em que há a figura de refém, como sequestro, roubo, cárcere privado e violação de domicílio, por exemplo.
Ao g1, a Polícia Civil do Paraná explicou que, por se tratar de um caso internacional, só pode se envolver nas investigações se a PF ou o Itamaraty pedirem apoio. Destacou, ainda, que não foi notificada sobre o caso de Antonio Augusto.
O g1 questionou o Itamaraty se o Governo Federal pediu envolvimento das polícias brasileiras no caso, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
Em nota, o órgão disse que “acompanha o caso e presta assistência consular aos familiares do desaparecido” e afirmou não poder passar informações detalhadas sobre casos individuais por regras de privacidade.
O g1 também questionou a PF sobre o caso, além de contatar a Polícia Nacional e o Ministério Público do Paraguai sobre o andamento das investigações, mas não obteve resposta de nenhuma das instituições.
Trauma mudou a vida da família
Antonio Augusto com o irmão mais novo, Pedro
Arquivo Pessoal
O trauma mudou a vida de Isabel e da família dela.
O filho mais novo dela atualmente tem 13 anos e mora com a mãe no Paraguai. Ela conta que faz tratamento psicológico tanto para tentar amenizar a dor do desaparecimento do primogênito, quanto para tentar reduzir o impacto do trauma na criação do caçula.
“Eu tive que fazer uma readaptação com o meu filho menor, e até hoje estou nesse projeto. É uma fobia tão grande que eu não podia perder meu filho do olho, tinha que saber o tempo todo onde ele estava. Aquela preocupação, aquele desespero”, afirma.
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