Bancas de pesponto mantêm 200 anos de tradição do calçado em Franca mesmo com baixa valorização


Essenciais para a costura dos sapatos, elas resistem ao tempo com o impulso de famílias que dependem da atividade como fonte de renda. ‘A fábrica diminui custo, a gente também tem que diminuir’, afirma pespontador. “Só a cola não segura. Passa a cola pra unir as peças e o pesponto é pra não desmanchar.” Na explicação prática de José Rubens de Lima Martins, a atividade que ele exerce nada mais é que uma aplicação da costura, mas no manuseio do couro.
Para a história econômica e social de Franca, no interior de São Paulo, a tarefa manual do pespontador é a base de uma tradição bicentenária do calçado, que ainda resiste ao tempo, mesmo com as novas tecnologias e diante de uma baixa valorização na cadeia produtiva.
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Banca de pesponto se mantém essencial para setor calçadista de Franca mesmo com baixa valorização e incremento de novas tecnologias
Aurélio Sal/EPTV
Em 200 anos de história, Franca consolidou-se como a capital nacional do calçado masculino, um setor que surgiu graças a uma combinação de fatores como a habilidade artesanal de imigrantes italianos e a crise do café, com a quebra da Bolsa de Nova York, em 1929, em meio a momentos de auge e queda, como a expansão das exportações, nos anos 1970, e a baixa nas vendas internacionais diante da concorrência com o mercado asiático.
Mesmo longe dos números que alcançou em décadas passadas, o sapato ainda é o carro-chefe da economia local e emprega milhares de pessoas – 14 mil apenas nas indústrias – com uma produção acumulada de mais de 30 milhões de pares entre janeiro e outubro de 2024 e um faturamento de US$ 42 milhões [R$ 245 milhões] somente com exportações.
E ainda que as inovações tecnológicas tenham otimizado muitos processos, da concepção ao embalo do sapato, as indústrias ainda dependem, em grande parte, do trabalho manual de pessoas como o José Rubens, que desempenha, como terceirizado, a função de costurar os sapatos.
Franca tem cerca de 2,5 mil bancas de pesponto que terceirizam parte do processo de produção de calçados da cidade
Aurélio Sal/EPTV
No pesponto, todas as peças que formam o “cabedal” – a parte de cima do sapato – são reunidas de maneira artesanal após o corte do couro. Somente depois disso, elas voltam para a fábrica para serem encaixadas na sola e embaladas.
Uma tarefa que demanda não só habilidade com as mãos, como também paciência e tempo, já que o ganho é de acordo com o número de calçados finalizados. Segundo a Associação das Bancas de Pesponto de Franca e Região, o preço médio pago por par nas bancas da cidade oscila entre R$ 8 e R$ 13.
“Precisava ser mais valorizado, porque hoje pra gente poder manter as coladeiras todas registradas o custo é alto. (…) O custo do sapato teria que ser mais alto, mas a gente também entende que está difícil o mercado para estar vendendo”, lamenta.
A atividade foi a opção encontrada como sustento desde que ele e a família deixaram Minas Gerais há 30 anos em busca de melhores oportunidades de trabalho. “Aprendi em Franca mesmo através de dois irmãos meus que pagaram o curso. Eles aprenderam, depois eles começaram e eu comecei com eles.”
Assim como ele, 7 mil pessoas espalhadas por cerca de 2,5 mil bancas atuam com o pesponto, passando o ofício de pai para filho, de irmão para irmão, de tio para sobrinho. “Você nasce, cresce, o pai está trabalhando, inclusive eu tenho meu menino que começou comigo e hoje trabalha igual.”
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Nos últimos anos, em consequência da forte concorrência estrangeira e dos desafios enfrentados pelas fábricas, ele também percebeu uma baixa na remuneração do serviço do pesponto.
José Rubens de Lima Martins, dono de banca de pesponto em Franca (SP)
Aurélio Sal/EPTV
“Aqui na minha banca eu trabalho das seis [da manhã] às sete da noite, pra você conseguir tirar um pouco mais. Você tá em casa, não tem um registro, um seguro-desemprego, décimo terceiro, não tem férias, é onde a gente puxa mais, é mais marido e mulher, um filho, um tio, uma tia, que esta ali por perto e junto trabalha.”
Mas é justamente pelo legado que ele deixa e por encontrar no pesponto a sua fonte de renda que, apesar de todas as dificuldades e limitações financeiras, o trabalho ainda hoje é objeto de orgulho.
“É cansativo, mas não tem o que reclamar, é o que garantiu meu sustento, alguma coisa que a gente adquiriu.”
Em um cenário ideal, José Rubens vislumbra um calçado mais valorizado para que toda a cadeia produtiva sinta os mesmos efeitos.
“Primeiro lugar tinha que melhorar para os fabricantes, pra eles poderem ter condições de ajudar mais as bancas, que terceirizam o serviço, isso em primeiro lugar, e hoje o custo fica muito alto, a gente busca, leva por conta da gente, linha, agulha, energia, tudo sai do bolso da gente, do custo em cima do sapato, do preço que eles pagam.”
Com colagem e costura, pesponto ainda guarda tarefas manuais no processo de fabricação do calçado em Franca, SP
Aurélio Sal/EPTV
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