Fim trágico no ciclo de violência contra mulher, feminicídio tem 111 vítimas na região desde 2015


Levantamento do g1 mostra que desde que tipificação foi incluída no Código Penal, região registra, em média, um caso por mês. Advogada destaca que principal desafio é o registro correto da ocorrência. Vanessa Rocha Teixeira e Janaina Meneghine (à dir.), vítimas de feminicídio na região de Campinas (SP) em janeiro de 2024
Reprodução/EPTV
Resultado trágico da escalada de violência contra a mulher, o feminicídio, cuja tipificação foi incluída no Código Penal em março de 2015, já fez 111 vítimas na região de Campinas (SP). O número representa, em média, uma ocorrência por mês em que mulheres são mortas em crimes de ódio motivados pela condição de gênero.
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Dos 31 municípios da área de cobertura do g1 Campinas, 20 registraram crimes tipificados como feminicídios desde 2015 – as vítimas mais recentes foram mortas no último domingo (14), em Campinas (SP) e Holambra (SP) – veja gráfico abaixo.
Quem era a mulher morta a tiros pelo companheiro em posto de combustíveis de Campinas
Morta na casa do namorado é 1º feminicídio em Holambra desde alteração do Código Penal em 2015
O caso da estância turística de 15 mil habitantes, inclusive, na avaliação da advogada Thaís Cremasco, cofundadora do movimento Mulheres pela Justiça, expõe uma falha inicial no registro da ocorrência, sem a correta tipificação do feminicídio – isso, pode, no entanto, ser corrigido durante o processo de investigação.
O assassinato de Vanessa Rocha Teixeira, de 31 anos, cujo corpo foi encontrado sem roupas e com hematomas na casa do namorado, foi registrado como inicialmente como homicídio na Delegacia de Jaguariúna (SP) porque Holambra não tem delegacia de plantão.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP), a Delegacia de Holambra instaurou inquérito nesta segunda (15) para apurar o crime de feminicídio, e o homem, de 59 anos, é investigado – até a publicação desta reportagem, ninguém havia sido preso pelo crime.
“Existem casos em que há dúvidas na hora do registro, mas em muitas ocorrências é evidente que o crime trata-se de feminicídio, como é o caso de Holambra. São poucos os erros, mas existe a necessidade de ser trabalhado a tipificação correta, para expor o que está acontecendo com vidas femininas”, pontua a advogada.
Em nota, a SSP esclarece que “a qualificação da natureza no registro da ocorrência é realizada pelo delegado (a) que esteve no local do crime”, e que “a tipificação pode ser alterada no decorrer das investigações sem prejuízos à elucidação dos fatos”.
Sobre ações promovidas pela pasta para reduzir casos de violência contra a mulher, e, consequentemente, feminicídios, a SSP defende que São Paulo possui “a maior estrutura do país para combater a violência de gênero”.
“São 140 DDMs, além da DDM Online, que permite o registro destes crimes pela internet, e das Salas DDMs 24 horas, que ficam anexas aos plantões policiais dos municípios, onde a vítima é atendida por uma equipe da DDM online por videoconferência”, enfatiza a pasta.
A advogada Thais Cremasco
Reprodução/Instagram
Ciclo de violência
Thais lembra que no caso de feminicídio é difícil falar em subnotificação, uma vez que a materialidade do crime mostra-se evidente para as estatísticas, mas que vale destacar que outros casos de agressão aos direitos das mulheres, relacionados com a escalada da violência, estão, sim, longe de transparecer a realidade.
“Se você pegar estatísticas de crime de violência sexual, os números mostram que no Brasil ocorre um estupro a cada 8 minutos. Mas sabemos que é muito mais, há pesquisas, estimativas que aconteçam a cada 2 minutos”, diz.
A advogada fez esse comparativo para lembrar que na ampla maioria dos casos, o feminicídio não aparece como primeiro ato de violência.
“Existe uma escalada da violência contra a mulher, existe um ciclo de relacionamento abusivo. Começa com um xingamento, um olhar. E não se pode colocar a culpa na vítima, muitas vezes inserida em um contexto ciclíco, que aposta ainda em um relacionamento por tentar perdoar, achar que vai ser diferente. Isso mostra um dado muito triste, em que a mulher não tem segurança dentro da sua própria casa”, opina Thais.
A Secretaria de Segurança Pública diz que a variação dos casos “é alvo de análise permanente por parte da pasta, que criou o programa SPVida, o qual analisa a dinâmica criminal dos crimes contra vida, incluindo os feminicídios”.
“De janeiro a novembro [de 2023], dos 195 casos ocorridos no Estado, 56,4% foram provocados devido a relação afetiva entre a vítima e o autor, e em outros 39,4% a vítima possuía relação com familiares ou amigos. Ainda, em 83% dos casos, a vítima já possuía um histórico de violência doméstica”, informa a pasta.
Para Thaís Cremasco, a legislação brasileira avançou bastante, a ponto de criminalizar a violência psicológica (não é necessário haver agressão física), e prevê pena de até 30 anos de prisão, o que não é brando na avaliação da advogada, mas outros fatores são fundamentais para combater o problema.
“Falta avançarmos no sentido de conseguir demonstrar às mulheres para que elas reconheçam os primeiros sinais de violência. E ensinar aos homens que mulheres não são propriedades deles. A causa número 1 de feminicídios envolve a mulher querer terminar o relacionamento. É direito de qualquer pessoas não estar com a outra. Precisamos fazer essa reflexão. Enquanto as mulheres não forem livres sequer para terminar um relacionamento, não vão viver em paz”, destaca.
Casos na região
Campinas e Holambra registram os primeiros casos de feminicídio em 2024
Um levantamento a partir de dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP) mostra 105 ocorrências tipificadas como feminicídio desde março de 2015 na região de Campinas. A estatística criminal considera dados até novembro de 2023.
Outros seis casos ocorreram entre dezembro de 2023 (4) e janeiro de 2024 (2), e ainda serão contabilizados nas estatísticas oficiais.
Campinas (SP), maior cidade da região, é a que reúne também o maior número de vítimas de feminicídio: 58.
Feminicídio: total de casos por município
Águas de Lindóia – 2
Americana – 4
Amparo – 1
Artur Nogueira – 1
Campinas – 58
Espírito Santo do Pinhal – 1
Estiva Gerbi – 1
Holambra – 1
Hortolândia – 6
Indaiatuba – 4
Itapira – 4
Louveira – 1
Mogi Guaçu – 3
Mogi Mirim – 7
Paulínia – 3
Pedra Bela – 1
Pedreira – 1
Pinhalzinho – 2
Serra Negra – 2
Sumaré – 8
Cidades sem ocorrências de feminicídio
Jaguariúna
Lilndóia
Monte Alegre do Sul
Monte Mor
Morungaba
Santo Antônio de Posse
Santo Antônio do Jardim
Socorro
Tuiuti
Valinhos
Vinhedo
O que prevê a lei?
Segundo o Código Penal Brasileiro, o feminicídio é punido com prisão que pode variar de 12 a 30 anos. De acordo com o texto da Lei do Feminicídio, a pena do crime pode ser aumentada em um terço até a metade, caso tenha sido praticado sob algumas condições agravantes, como:
Durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto
Contra pessoa menor de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência
Na presença de descendente ou ascendente da vítima
Prédio da 1ª DDM de Campinas.
Luciano Claudino/Código19
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