Faculdade de São Bernardo do Campo é acusada de racismo por cartaz segregacionista

Cartaz fixado em porta de sala de aula na Faculdade de Direito de São Bernardo do CampoArquivo pessoal

No início de novembro, alunos do 3º ano da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (FDSBC), no ABC Paulista, foram acusados de racismo ao fixar um cartaz com a frase “Entrada permitida somente para brancos” dentro de uma sala de aula. O cartaz foi parte de uma atividade pedagógica sobre segregação racial nos Estados Unidos, mas a ação foi vista por muitos como uma reprodução indevida e insensível de práticas de discriminação.

A foto do cartaz foi tirada por um aluno não identificado e compartilhada em grupos de WhatsApp, gerando indignação entre os estudantes e culminando em uma denúncia formal. O advogado Juliano Amaral, aluno de pós-graduação na instituição, foi contatado por um estudante que recebeu a imagem e registrou um boletim de ocorrência por racismo contra a faculdade.

Após a denúncia, a direção da FDSBC convocou uma reunião com o corpo docente e os alunos envolvidos na atividade, que alegaram que a placa foi colocada como parte de um trabalho acadêmico.

Segundo os envolvidos, a placa fazia parte de uma análise crítica do filme “Histórias Cruzadas” e tinha a intenção de promover discussões sobre as consequências jurídicas do racismo. No entanto, o rodapé com a explicação, que deveria esclarecer a intenção pedagógica, não aparece na foto.

“Como ele pediu que os alunos viessem a caráter, reproduzir, eles achavam tudo bem reproduzir ‘Histórias Cruzadas’ em pleno 2024. Todo mundo tem muito medo de falar alguma coisa, são poucos alunos negros. Então, todo mundo tem medo de sofrer retaliação”, disse um aluno ao portal “g1” que fez a denúncia e prefere não ser identificado.

Segundo o estudante, os alunos negros são em pequeno número e não são ouvidos. “Nessa turma não tem alunos negros. No 3º ano, no geral, são pouquíssimos. Então, tem quem teve medo de denunciar e quem não viu problema. Quando acontece esse tipo de coisa, tudo o que fazem são palestras, mas eles não conversam com professores, não ouvem alunos negros, só fazem as palestras para dizer que estão fazendo algo”, continua.

A universidade explicou, em nota, que a atividade foi realizada durante uma aula de Sociologia e Antropologia, com o objetivo de discutir o racismo e suas implicações.

“A Faculdade reafirma seu compromisso com a promoção de um ambiente inclusivo e repudia veementemente qualquer forma de discriminação. Para reforçar esse compromisso, disponibilizamos diversos canais de denúncia, como o ‘Fale com o Diretor’, a Ouvidoria, o contato direto com os coordenadores de curso e uma caixa de denúncias anônimas localizada nas dependências da instituição. Após a recepção das denúncias, as providências cabíveis são tomadas, incluindo a instauração de processos administrativos internos e, quando necessário, a comunicação às autoridades competentes.”

A tarefa envolvia a análise do filme “Histórias Cruzadas”, que retrata a segregação racial no Mississippi na década de 1960. A instituição afirmou que o trabalho visava combater o racismo e criticava as cenas do filme que abordam a discriminação racial entre brancos e negros. A atividade também se inspirou no Museu do Apartheid, na África do Sul, onde ingressos diferenciados para brancos e negros são usados para impactar o público.

Porém, o incidente levantou questionamentos sobre a abordagem e a sensibilidade da atividade. Estudantes, especialmente negros, manifestaram desconforto com a reprodução de cenas de segregação racial em uma sala de aula, em um momento em que as questões de discriminação continuam sendo uma realidade em muitas instituições de ensino.

O caso foi registrado no 1º Distrito Policial de São Bernardo do Campo, onde a investigação preliminar concluiu que não houve ato criminoso. No entanto, o clima na faculdade continua tenso, com relatos de que casos de racismo são recorrentes e que os alunos negros são minoria e frequentemente não têm suas vozes ouvidas.

Em resposta ao ocorrido, a FDSBC afirmou que realiza debates sobre diversidade e violência racial, além de ter um núcleo dedicado a tratar desses temas. A instituição também disponibiliza canais de denúncia, como a Ouvidoria e uma caixa de denúncias anônimas, para garantir que qualquer forma de discriminação seja tratada com seriedade.

O filme “Histórias Cruzadas”, que inspirou a polêmica atividade, acompanha a personagem Skeeter, uma escritora branca que entrevista mulheres negras que trabalhavam como empregadas domésticas para a elite branca.

Apesar de ter sido um sucesso de crítica, o filme é constantemente acusado de adotar a narrativa do “branco salvador”, uma trama que coloca um personagem branco no centro da luta contra o racismo, enquanto marginaliza as experiências e lutas das pessoas negras, como apontado pela atriz Viola Davis, que se arrependeu de ter participado da produção.

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