95% dos presos da saída de Natal de 2023 voltaram; entenda como funciona o benefício


Senado pode votar nesta terça-feira (20) vota projeto que pode acabar com o benefício em datas comemorativas. Benefício é concedido para presos com bom comportamento e que estejam em regime semiaberto. A saída temporária de Natal de 2023 – a mais recente concedida – beneficiou pouco mais de 52 mil presos. Desses, 95% (49 mil) voltaram às cadeias dentro período estipulado. Os outros 5% (pouco mais de 2,6 mil), não.
Os dados são de um levantamento publicado pelo g1 em 18 de janeiro, após o fim do prazo para retorno.
O levantamento mostrou, também, que o benefício foi concedido em 17 das 27 unidades da federação, que Rio de Janeiro, Bahia, Pará e Sergipe registraram os maiores percentuais de não retorno (acima de 10%), e que Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Piauí e Rondônia tiveram os menores índices (abaixo de 20% – veja no infográfico abaixo).
Nesta terça (20), o Senado pode votar um projeto que acaba com benefício, concedido a presos com bom comportamento, que cumprem pena em regime semiaberto (podem ser autorizados a sair para trabalhar ou estudar fora da unidade prisional durante o dia) e que já cumpriram parte do tempo de punição (leia mais abaixo).
O texto foi aprovado na Câmara em 2022, mas foi alterado no Senado e, se aprovado, terá ser novamente avaliado pelos deputados.
O relator do projeto no Senado, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), diz que esse tipo de saída tem colocado a população em risco. Especialistas afirmam que acabar com a saidinha atrapalharia a ressocialização.
Veja mais, abaixo, após o infográfico, como funcionam as saídas temporárias em datas comemorativas e feriados e por que o tema voltou a ser debatido no Congresso.
17 estados concederam saidinhas de Natal em 2023 – USAR ESTE
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O que são as saídas temporárias e como funcionam?
As saídas temporárias em datas comemorativas e feriadas – conhecidas como saidinhas ou saidões de Natal, Dia das Mães etc. – são um benefício que costuma ser concedido aos presos do regime semiaberto pela Justiça com base na Lei de Execuções Penais.
O benefício só é concedido aos detentos que:
Tenham bom comportamento;
Não tenham praticado faltas graves no último ano;
Tenham cumprido parte da pena (1⁄6 para réus que estão cumprindo a 1ª condenação, e 1⁄4 para reincidentes).
Além disso, as unidades prisionais precisam avaliar se a saída cumpre os objetivos da pena da pessoa. A partir desses dados, o Ministério Público emite um parecer favorável ou contrário à saída temporária e o juiz ou a juíza da Vara de Execuções Penais decidem se concedem ou não o benefício.
A legislação atual permite que juízes autorizem as “saidinhas” a detentos do regime semiaberto para:
visitas à família
cursos profissionalizantes, de ensino médio e de ensino superior
e atividades de retorno do convívio social
Com as mudanças do pacote anticrime, em 2020, o preso condenado por crime hediondo com morte não tem mais direito a saída temporária, a não ser que tenham obtido o benefício antes da mudança da lei.
O projeto que pode ser voltado nesta terça acaba com as saídas para visitas e atividades de convívio social.
Em regra, a saidinha em datas festivas dura 7 dias e pode ser concedida 4 vezes no ano, com intervalo de 45 dias entre elas.
Os presos são proibidos de frequentar bares e casas noturnas —independente da hora— e devem ficar durante toda a noite no endereço informado à Justiça.
O benefício é revogado caso o preso cometa algum crime ou deixe de cumprir alguma das regras da saída.
Para que serve a saída temporária em datas comemorativas ou feriados?
A saída temporária existe para que o preso seja reintegrado à vida em sociedade de forma progressiva, aos poucos, durante o cumprimento da pena, argumenta o ex-secretário nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Rafael Velasco — substituído com a entrada do ministro Ricardo Lewandowski na pasta.
“As saídas temporárias fazem parte do processo de reintegração social do preso, de reaproximação familiar e social. Uma ressocialização para que o preso não seja lançado diretamente do cumprimento da pena no regime fechado para a sociedade sem chance de progressivamente ser reintegrado, como prevê o sistema”, disse ao g1, em janeiro de 2024.
Velasco disse, na ocasião, que é “oportuno debater” as saidinhas. “Mas tem que debater com seriedade, sem populismo, para resolver os problemas e não para ganhar voto ou clique”. Para o secretário, associar saidinhas ao aumento de crimes é “uma muleta argumentativa que não tem base em estudo”.
A desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivana David avalia que o benefício pode ser aprimorado. A extinção, porém, seria um excesso, avalia ela.
“Acaba prejudicando presos que têm cumprido devidamente a sua pena dentro do sistema prisional, se comportam bem, saem para trabalhar, voltam. Tem preso que sai na temporária e volta. Já saíram três, quatro, cinco vezes e nunca tiveram qualquer problema. Então, proibir toda saída temporária vai causar uma injustiça do lado inverso”, disse.
Saidinha de Natal beneficiou 52 mil presos; 49 mil retornaram e 2,6 mil, não
Debate sobre as saidinhas
O debate sobre o fim das saidinhas voltou à tona após Roger Dias da Cunha, um policial militar de Minas Gerais, ser morto por um preso que foi beneficiado com a saidinha de Natal, em 6 de janeiro.
Welbert de Souza Fagundes cumpria pena no semiaberto. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) foi contra a inclusão dele na lista de beneficiados pela saída de Natal por conta de um furto ocorrido durante saidinha em 2022. A Justiça, entretanto, concedeu novamente o benefício ao preso.
Ministério Público denuncia suspeito de matar policial com tiro na cabeça durante ‘saidinha’
Após o crime, Fagundes foi preso novamente e punido com a volta ao regime fechado — a chamada regressão de pena, que ocorre quando um preso comete algum delito e perde o benefício de estar em regime semiaberto (que admite a possibilidade de estudar ou trabalhar fora da prisão) ou o em regime aberto (cumprimento de pena em prisão domiciliar ou com tornozeleira eletrônica, por exemplo).
A morte do PM levou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a reagir e propor que o Congresso debata medidas de ressocialização de presos – caso da saidinha. O projeto que acaba com o benefício, aprovado pela Câmara em 2022, será votado nesta terça-feira.
“Embora o papel da segurança pública seja do Executivo, e o de se fazer justiça, do Judiciário, o Congresso promoverá mudanças nas leis, reformulando e até suprimindo direitos que, a pretexto de ressocializar, estão servindo como meio para a prática de mais e mais crimes”, publicou na rede social X, ex-Twitter.
Em 6 de fevereiro, a Comissão de Segurança Pública (CSP) do Senado aprovou a proposta relatada por Flávio Bolsonaro que acaba com o projeto.
Semanas antes, Pacheco chegou a se reunir com o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) para tratar do texto.
Moro foi autor de uma emenda, acatada por Flávio, que alterou o texto aprovado pela Câmara, rejeitando o fim de todas as possibilidades de saídas temporárias e mantendo as hipóteses de estudo e trabalho.
Para parlamentares, o acompanhamento próximo de Pacheco à proposta sinaliza que o texto não deve enfrentar problemas na votação em plenário.
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